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segunda-feira, 20 de setembro de 2010

PARA ESPECIALISTAS, LULA PASSOU DOS LIMITES


"Nós somos a opinião pública", disse o presidente. Entidades reagiram

Marina Dias, Adriana Caitano
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva participa da entrega de casas populares na manhã deste sábado (18), em Campinas

Lula participa da entrega de casas populares,sábado (18), em Campinas (Mauricio Lima/AFP)

Marcus Vinicius Furtado Coelho , da OAB: "Ele é hábil com as palavras e acaba dirigindo o debate para o papel da imprensa, quando uma investigação deveria ser discutida" Lula só defende a imprensa quando as matérias publicadas afetam seus adversários, mas quando afetam seus aliados, ai a imprensa não presta!

Durante comício na cidade de Campinas (SP), no último sábado, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva esbravejou declarações agressivas contra a imprensa que causaram indignação em vários setores da sociedade. Temendo que a ligação de sua candidata à Presidência da República, Dilma Rousseff, com a ex-ministra Erenice Guerra, envolvida em escândalos na Casa Civil, causasse reflexos na corrida eleitoral, Lula acionou o botão de emergência.

Em um discurso inflamado, atacou os veículos de comunicação, classificando-os como destiladores de ódio e mentira. "O que eles não se conformam é o pobre estar conseguindo enxergar com os seus olhos, não precisa do tal do formador de opinião pública. Nós somos a opinião pública e nós mesmos nos formamos”, disse. De acordo com especialistas consultados pelo site de VEJA, Lula passou dos limites quando deixou a emoção dominar suas palavras em cima do palanque. 
Especialista em direito eleitoral e secretário-geral da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Marcus Vinicius Furtado Coelho acredita que Lula tem desviado o foco da questão ao atacar a imprensa em vez de discutir o mérito das denúncias contra integrantes de seu governo. "Ele é hábil com as palavras e acaba dirigindo o debate para o papel da imprensa, quando uma investigação deveria ser discutida". Para Coelho, um comentário do presidente deve ser encarado com cautela. "Lula fala do alto de sua popularidade e acaba se convencendo de que a opinião dele é a da maioria do povo, mas a verdade é filha do tempo, não da autoridade, como disse Abraham Lincoln", rebate o secretário-geral da OAB. 
Professora de direito eleitoral da Universidade de São Paulo (USP), Monica Herman Caggiano considera a fala do presidente um "discurso típico de comício" e defende que ele demonstrou ter medo da crítica. "Na realidade, ele não está no ataque, mas na defesa. Criticou a imprensa porque se sentiu incomodado e com medo de que as denúncias atinjam a campanha".

Já o professor de Relações Internacionais da Universidade de Brasília (UnB), Antonio Jorge Ramalho, acredita que esse tipo de "opinião inflamada não vai modificar o processo eleitoral". "Quando Lula afirma que "nós somos a opinião pública", explica Ramalho, ele está querendo associar-se ao povo mais pobre. "Mas não concordo com essa declaração, pois sempre haverá formadores de opinião, pois essa é uma responsabilidade das lideranças sociais, e não só políticas". 

Reações petistas - Lula não chegou a declarar, em público, aquilo que disse o ex-ministro da Casa Civil e deputado cassado José Dirceu, um dos réus do processo do mensalão. Em evento com sindicalistas em Salvador (BA), Dirceu afirmou que há "excesso de liberdade e do direito de expressão e da imprensa". A frase resume o pensamento da esquerda brasileira a respeito do assunto.

Nesta segunda-feira, foi a vez de Dilma Rousseff atacar os meios de comunicação. Irritada com as acusações de irregularidades em sua gestão na Secretaria de Minas e Energia do Rio Grande do Sul e na Federação de Economia e Estatística do estado, publicadas pelo jornal Folha de S. Pauloa candidata transformou uma agenda pública de campanha em oportunidade para atacar a imprensa. "Quero fazer um protesto veemente contra a parcialidade do jornal Folha de São Paulo. Fui julgada em todos os anos pelo TCE. Todas as minhas contas foram aprovadas". 

Também nesta segunda-feira, a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), a Associação Nacional dos Jornais (ANJ) e a Associação Brasileira das Emissoras de Rádio e Televisão (Abert) reagiram à fala do presidente. Ophir Cavalcante, presidente da OAB, chegou a afirmar que as declarações de Lula foram "lamentáveis". Em cima do palanque - e ao lado de Dilma - o presidente disse: "Tem dia que determinados setores da imprensa brasileira chegam a ser uma vergonha. Se o dono do jornal lesse o seu jornal ou se o dono da revista lesse sua revista, eles ficariam com vergonha do que eles estão escrevendo exatamente nesse momento". 
Em 2004, Lula já havia protagonizado outro episódio alarmante para a imprensa livre. O presidente veio a público defender a criação de um Conselho Federal de Jornalismo, entidade que, segundo a proposta do governo, teria poderes de "orientar, disciplinar e fiscalizar" a atividade jornalística. O projeto - que também previa a punição a jornalistas - acabou sendo abortado. No fim de 2009, o presidente criou o 3º Programa Nacional de Direitos Humanos, uma espécie de carta de intenções que pretendia instaurar uma comissão para limitar o conteúdo de empresas de comunicação. O projeto recebeu críticas de diversas entidades e, em maio de 2010, Lula voltou atrás, assinando a retirada dos itens que indicavam o monitoramento da imprensa.

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