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segunda-feira, 28 de maio de 2012

Sem educação formal, irmãos ganham prêmios

Sem educação formal, irmãos ganham prêmios:

Sem educação
formal, irmãos ganham prêmios 

Fora de escola
desde 2006, os jovens estudam em casa apenas os temas que lhes interessam e não
pensam em cursar faculdade

Ocimara
Balmant
e Fernanda
Bassette
, de O Estado de S. Paulo
Davi e Jônatas estão com as malas
prontas para a primeira viagem ao exterior: vão para a Califórnia em agosto.
Ganharam as passagens e a estadia para a Campus Party americana após vencerem
um concurso na edição brasileira do evento.
Por aqui, eles concorreram com mais de 7
mil "nerds", egressos dos cursos de Engenharia e Ciência da
Computação. O currículo dos campeões, no entanto, é bem mais modesto. Eles
abandonaram a escola antes de concluir o ensino fundamental.
Os dois foram educados pelos próprios
pais, em casa. "Se eu estivesse no colégio, estaria entrando na universidade.
Em casa, foquei apenas no que gosto. Não perdi tempo nas disciplinas que não me
interessam", diz Davi, de 19 anos. Jônatas, um ano mais novo, alfineta:
"Mesmo porque o melhor é ter uma boa ideia. Depois, se for preciso, coloco
um engenheiro para programar".
A cada afirmação, os dois olham de
soslaio para o pai, sentado no sofá ao lado e se segurando para ele mesmo não
responder a todas as perguntas. A cada prêmio dos filhos - só nos primeiros
quatro meses deste ano eles já ganharam cerca de R$ 30 mil em concursos -
Cléber Nunes se convence ainda mais da decisão tomada no fim de 2005, quando
Jônatas e Davi terminaram a 5.ª e a 6.ª série.
"Mas, mesmo com todos esses
prêmios, ainda dizem que neguei educação para os meninos", diz o pai,
referindo-se ao crime de abandono intelectual pelo qual ele e a mulher,
Bernadeth Nunes, foram condenados em 2010. Também teriam de pagar uma multa,
estimada hoje em R$ 9 mil, pela condenação em um processo na área cível por
descumprir o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). "Não quitamos
porque temos certeza de que nossos filhos receberam instrução adequada",
afirma a mãe.
Quem a vê tão convicta nem imagina que
ela era terminantemente contra a decisão do marido. Tanto que, na primeira
tentativa de Cleber, no fim de 2004, Bernadeth vetou a ideia. Para convencer a
mulher, ele foi aos Estados Unidos, conheceu famílias que praticavam o ensino
domiciliar e trouxe uma mala cheia de material sobre o tema.
Começava aí seu processo de
"doutrinação" que só tem ganhado adeptos. A mais nova convertida é a
pequena Ana, a caçula da família. Aos 5 anos, ela já sabe ler e escrever, é
fluente em inglês e, apesar de nunca ter frequentado uma escola, tem uma
opinião formada sobre o que se aprende na instituição: "Nada".
Informal.
A sala de aula da menina é um cantinho do escritório coletivo que fica no
térreo do sobrado em que a família vive, no município mineiro de Vargem Grande.
No espaço, as bonecas ficam junto dos livrinhos de tecido costurados por
Bernadeth.
Enquanto a mãe ensina a menina a ver as
horas, Jônatas desenvolve um software para informatizar as mercearias do
município, e Davi é capaz de se esquecer de comer só para programar os códigos
que darão origem a um programa capaz de ajudar os candidatos a vereador e a
prefeito a mapear redutos eleitorais e traçar estratégias de comunicação.
Creditam todo o aprendizado à técnica
implementada pelo pai, autodidata que saiu da escola no 1.º ano do ensino
médio.
Assim que os tirou da colégio, Cléber os
ensinou lógica, argumentação e aritmética, base a partir da qual eles poderiam
estudar o que lhes conviessem. Davi e Jônatas decidiram ignorar disciplinas
como química, biologia e geografia. "Por que eu deveria saber o que são
rochas magmáticas?", questiona Jônatas.
Das disciplinas oficiais, ficou somente
o inglês. Para estimular a fluência, Cléber comprava cursos de informática em
inglês e pedia que os filhos legendassem documentários.
Atualmente, cada um faz seu currículo e
seu horário. Mas nunca são menos de seis horas diárias, seis dias por semana.
Jônatas, webdesigner, dispersa fácil, tanto que decidiu sair do Facebook para
não perder tempo. Davi, programador, é mais centrado, cumpre à risca a grade
horária colada no mural do seu quarto, ao lado de onde se vê um versículo
bíblico em hebraico, idioma que ele aprendeu sozinho com o intuito de
compreender melhor textos do livro sagrado.
Motivação.
A retirada dos filhos da escola coincidiu com a decisão da família por uma vida
mais simples e de retorno a padrões morais descritos na Bíblia.
Cléber abriu mão de sua empresa de
produtos de aço inoxidável, como troféus e placas de honra, para fabricar as
peças no quintal de casa. Bernadeth, que era decoradora e cursava Arquitetura,
abandonou o curso e, desde então, dedica-se a cuidar da casa e a alfabetizar a
filha.
Por fim, trocaram a cidade de Timóteo,
com 80 mil habitantes, pela pequena Vargem Alegre, de apenas 7 mil moradores e
quase nenhuma opção de lazer. "O pai nos comunicou sobre a mudança. No
começo, estranhamos, mas agora já me acostumei com o passeio na pracinha da
igreja", diz Davi.
Vez ou outra, jogam futebol com os
vizinhos e viajam a Timóteo para encontrar os primos e os ex-amigos de escola.
No dia a dia, e sem TV em casa, os cinco estudam, trabalham, fazem as refeições
e divertem-se assistindo a vídeos do Youtube. Mas não cansa ficar tanto tempo
juntos? Pelo jeito, não. Como acompanhantes da viagem à Califórnia, os meninos
não hesitaram: vão levar o pai e a mãe.
Divulgação: www.juliosevero.com
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