sexta-feira, 9 de julho de 2010
Qual a sensação de quebrar um recorde de velocidade?
Semana passada, um Bugatti Super Sport 16.4 alcançou os 431,07 km/h e tornou-se o carro de produção mais rápido do planeta. Mark Spinelli, ex-editor chefe do Jalopnik e atual editor da 0-60, conversou com o piloto de testes que alcançou a marca.
O piloto de testes da Bugatti – er, pilote official - Pierre Henri Raphanel quebrou o recorde de velocidade em um veículo de produção com o novo Veyron Super Sport 16.4. O monstro de 1200 cavalos e 152,96 kgfm levou Raphanel a duas passagens (428 km/h e 434 km/h) na pista de testes da Volkswagen em Ehra-Lessien, próximo à Wolfsburg. Segundo o pessoal do Guinness, dá uma média de 431,07 km/h. É mais que o suficiente para trazer o título de volta para o lado da VW. Telefonamos para o ex-piloto de F1 e carros de turismo para ouvir suas impressões do que é ultrapassar os 430 km/h em um carro de produção, por que a floresta é sua amiga, e se ele está disposto a chegar aos 480.
Qual a sensação de alcançar os 430 km/h em um Veyron?
Ë basicamente um exercício mental. Fisicamente, você não precisa fazer muito mais que manter seu pé direito afundado. Mas naquela velocidade, se algo acontece você sabe que não voltará aos boxes para contar qual foi o problema. E isso cria uma pressão, algo que empolga. Na noite anterior não consegui dormir porque estava muito estressado. Quando acordei, olhei para o alarme e ele mostrava 4:27. E no dia seguinte, durante minha primeira tentativa, alcancei 427 quilômetros por hora. E dois dias depois de quebrar o recorde, continuei a dormir mal, devido ao estresse e a adrenalina, acordava às 4:26 e era como se eu estivesse me acalmando e a velocidade do relógio se diminuindo aos poucos.
Como piloto, há alguma diferença entre chegar aos 430 km/h ou ir a, digamos, “somente” 400?
Quando você está a 400 em um Veyron, o carro continua completamente sob o seu controle. Ele não se move, e você praticamente pode controlá-lo com dois dedos. Quando você tenta quebrar um recorde de velocidade, há uma interação entre o asfalto e o carro que você não percebe quando está a 400. Quando começa a fazer 415, 420, 425, o carro de certa forma segue para onde o asfalto o direciona. E é uma sensação estranha porque você não está realmente no controle como piloto. Você não sabe para onde as coisas vão dar. Você não tem nenhuma interação com o esterçamento porque tudo é muito rápido e você não quer que nada se mova. Então é como uma situação desconhecida, porque ninguém nunca chegou lá, mesmo em treinos na fábrica. É bem estressante.
Parece realmente estressante.
Além disso, onde quebramos o recorde [Ehra-Lessien] fica no meio de uma floresta. E não há espaço para erros. Não é como em um deserto de sal.
Você se deparou com algo inesperado durante a quebra?
Para conseguir o recorde você precisa completar a reta nas duas direções. Em Ehra-Lessien, ninguém dirige no sentido contrário, então foi como uma descoberta para mim e para a equipe. Eu só tinha três chances para lidar com isso. Você vai me dizer que não há nada para descobrir porque é apenas uma reta. Sim, claro, mas o asfalto reage de forma diferente. E realmente foi muito mais difícil completar a primeira parte, mais lenta, no sentido contrário que a segunda, mais rápida, mas no sentido tradicional da pista.
Além disso, quando íamos no sentido contrário, tínhamos um pouco de vento contra, motivo pelo qual não pudemos alcançar a mesma velocidade que na segunda parte. E no fim da reta, [descobri que] se eu freasse mais tarde, seria protegido [do vento] pela floresta. Então eu decidi começaria a frenagem mais tarde, uns 300 metros, só para chegar nesta área da floresta protegido do vento e conseguir um quilômetro por hora e meio a mais. Então eu fiz isso no dia anterior e funcionou, aí fiz o mesmo no dia seguinte. Mas em meio a tudo isso, e porque sabia que atrasei a frenagem, freei um pouco mais forte, o que é algo bem leve quando se está àquela velocidade, e de repente o carro foi da faixa central para a faixa da direita. E eu não estava no controle. E a floresta estava bem próxima. Então creio que essa diferença foi por minha causa, e estou muito orgulhoso disso.
Você percebeu os 200 cavalos a mais de potência?
Comparado a qualquer outro supercarro em que você sente a potência do motor caindo e muda as marchas, no Veyron a potência nunca cai. Sempre está lá. No Super Sport, não apenas a potência do motor não cai, ela aumenta. Então a sensação é que a potência sobe, a sensação de velocidade aumenta. Ele apenas continua. É uma sensação incrível.
Como o Veyron Super Sport se compara a outros carros recordistas de velocidade?
As pessoas tentam comparar carros, para dizer, este carro é mais rápido, mais potente, mais “algo”. O que é bem diferente no Bugatti é que nós tentamos combinar coisas que não se espera que funcionem juntas. Algo como, o carro mais rápido do mundo que pode ficar sete horas no trânsito em primeira marcha. Normalmente isso não funciona. E o mesmo com relação ao desenho do carro. Será que estas formas realmente chegam a 430 km/h? Sim, chega, mas basicamente se você começa com uma folha de papel em branco e você diz “eu quero fazer um carro que quebre o recorde de velocidade”, você não vai escolher estas formas. O design veio antes, e eles o deram para um engenheiro, que trabalhou em volta do desenho sem alterá-lo.
Esta é a história do Veyron. E é essa combinação que dá trabalho para os engenheiros, porque você tenta alcançar uma longa durabilidade, qualidade, velocidade, luxo, dirigibilidade; você quer tudo e normalmente ninguém pode ter de tudo. Se você tenta conseguir todas essas coisas de um mesmo carro, é algo incrível. O Super Sport é um carro com garantia de três anos. Então não é como se você compra o carro, e depois de usá-lo por um dia ele se destrói. E é aí que o processo de engenharia fica difícil e caro.
Com o Super Sport, o engenheiro disse que precisávamos que o desenho seguisse as exigências da engenharia – mais potência, mais velocidade e torque – e o projetista seguiu os pedidos do engenheiro em termos de downforce, refrigeração [nota: as belas entradas de ar sobre o carro] e todo esse tipo de coisas, e então fizeram o carro. Foi um processo um pouco diferente do Veyron.
“O Veyron é um carro para o cotidiano, que você pode dirigir em meio ao congestionamento e a 400 km/h com a mesma facilidade.”
O objetivo para os engenheiros era fazer um Veyron com mais potência, mais velocidade, mais torque. É uma tarefa completamente diferente de dizer algo como, “certo, só quero alcançar o recorde de velocidade”, e você constrói um carro com toda a aerodinâmica e pensa tudo sob essa perspectiva. O Veyron é um carro para o cotidiano, que você pode dirigir em meio ao congestionamento em primeira marcha, e por outro lado, alcançar 400 km/h com a mesma facilidade. Com aquele carro, com aquele motor, com aquela transmissão, nós fizemos cerca de trinta testes a cerca de 420 km/h, para ter certeza. E o carro continuará a ser usado como um carro de testes. E eu perguntei [ao engenheiro], “mas não vai receber uma transmissão nova? Um motor novo?”
Eu preferia começar com algo novo, zerado. Mas não foi um problema.
O mesmo aconteceu com os pneus. É um conjunto normal [de fábrica]. [Michelin PAX “run-flat” 245/690 R 520 (dianteiros) 365/710 R 540 (traseiros) – Ed.] Quando se alcança este tipo de velocidade extrema, a durabilidade do pneu é bem curta, não apenas em termos de desgaste como em termos de estrutura. E no dia anterior fiz cerca de cinco testes, e no dia seguinte tinha que usar os mesmos pneus. E eu disse, “você não acha que precisamos trocar os pneus?” E o engenheiro disse não, nós sabemos a margem de segurança dos pneus, então não precisamos trocá-los. Para mim, aquilo foi incrível, mas também muito, muito estressante.
Então, que tal 480 km/h. Você toparia?
Com tudo o que senti semana passada, eu diria que não é para mim. Acho que cheguei ao meu limite.
Se você pudesse ter qualquer Veyron que quisesse, com qualquer combinação de cores, qual seria?
Você não pode comparar o Super Sport. É algo que faz o Veyron não se destacar, o que é incrível. Eu sempre disse que o Veyron é como outro planeta. Mas agora estou sem palavras para explicar o que é o Super Sport. Entre o Veyron nós temos uma série em carbono preto, apenas 15 unidades, preto com o interior laranja [Sang Noir – Ed.] e o visual do carbono preto, rodas grandes, o mais esportivo que já vi. Seria esse.
Este texto foi publicado originalmente na 0-60 Magazine no dia primeiro de julho de 2010.
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