O Estado de S. Paulo - 05/05/2010 |
O termo "judicialização" - sobre o qual Antonio Houaiss não registra sinônimo nem definição em seu dicionário - frequenta o noticiário político desde que o Judiciário passou a ter um papel mais ativo na interpretação das leis e na imposição dos limites, por vezes constitucionais, a determinadas condutas. Foi uma reação quase imediata. O Judiciário atuava no vácuo das omissões do Legislativo, e do Parlamento a tese ia ganhando adeptos, sendo repetida em vários setores até que se restabeleceu agora no cenário da eleição presidencial por causa da série de ações judiciais recíprocas entre PT e PSDB. A expressão tem caráter pejorativo. Como que aponta interferência indevida da Justiça em assuntos da alçada exclusiva dos políticos e partidos. Há quem veja no recurso à Justiça um fenômeno malsão. Uma deformação, algo a ser evitado. O presidente do PT, José Eduardo Dutra, se orgulha de seu partido até agora nunca ter recorrido à Justiça contra o adversário. Diz que só decidiu fazê-lo como forma de represália. "Eles (os tucanos) já entraram com mais de dez (ações) contra Lula e Dilma. Agora tudo o que eles fizerem conosco, vamos fazer também." Vejamos se ficou bem entendido. Até agora o PT tinha motivos para reclamar de infrações do PSDB à lei e não o fez. Por que? Fidalguia? Suposição de que assim poderia transgredir valendo-se da gentileza ao molde de contrapartida? Ou não havia motivo relevante, continua não havendo e o PT agora entrará na Justiça ainda que a ação seja inconsistente? Seja como for, a argumentação de José Eduardo Dutra não obedece aos ditames republicanos que políticos tanto gostam de invocar. Ademais, convenhamos: reclama da "judicialização" quem se sente prejudicado. Enxerga desvantagem quem infringe a lei com frequência e gravidade, ficando mais vulnerável a punições. Os indignados com o fato de conflitos se decidirem na Justiça queriam o quê? Que políticos e demais setores da sociedade resolvessem suas questões sem a arbitragem judicial? Descontada a hipótese de se dirimir conflitos no braço, sobram os tribunais como o único foro civilizado em que se garantem condições de igualdade independentemente do peso das armas à disposição dos oponentes. As críticas à chamada "judicialização" da política, ao menos nos termos em que se apresentam, são puro sofisma. Seja no Parlamento, seja em ambiente de campanha eleitoral, o que se esconde por trás delas é mal disfarçada vontade de transgredir livremente sem a Justiça no meio para atrapalhar. Exatamente o que aconteceria se ninguém recorrer à arbitragem do tribunal para assegurar a aplicação da lei. Pois se com a aplicação de multas do TSE o presidente Luiz Inácio da Silva faz o que faz; se agora o PSDB foi acusado pelo PT por usar dinheiro de governos tucanos em ato de campanha de José Serra; se a realidade mostra a necessidade de vigilância estreita, imagine o caro leitor/eleitor se não houvesse a Justiça como limite. Essa não. A tal gafe do Nordeste Dilma Rousseff não cometeu. Ela disse que os nordestinos emigraram para o Brasil no sentido de o restante do País. No máximo falhou por não concluir o raciocínio. Notório saber. Toda eleição é a mesma coisa: famosos de médio porte de diversas áreas são procurados ou procuram partidos para se habilitar à conquista de um mandato. As legendas querem "puxadores" de voto; as razões das quase celebridades variam da vaidade à suposição de que terão acesso ao poder, mas o traço de união entre todas é o profundo desconhecimento em relação ao mundo em que pretendem entrar. Tanto é que a grande maioria dos eleitos tem atuação pífia e não prospera no ramo. No time que se apresenta à eleição deste ano, um rapaz de nome Kleber, codinome Bambam, ex-BBB por profissão, promete se empenhar no aprendizado para se candidatar a deputado. Seu mestre? O cunhado, experiente veterinário. |
quarta-feira, 5 de maio de 2010
A Justiça é o limite
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