Leia editorial do Estadão deste domingo:
As tentativas de controlar os meios de comunicação no Brasil podem ser abertas ou camufladas. Nos últimos dias, surgiram exemplos das duas modalidades. No primeiro caso, amplamente noticiado, a Assembleia Legislativa do Ceará aprovou, por unanimidade, o projeto de uma deputada petista que institui no Estado um Conselho de Comunicação Social - na linha prevista pela aparelhada Conferência Nacional de Comunicação (Confecom), realizada em dezembro de 2009, sob os auspícios do Planalto. As suas diretrizes frequentaram brevemente o programa da candidata Dilma Rousseff, antes de serem expurgadas por evidente inconveniência eleitoral.
A segunda manobra, que tenta encobrir a sua verdadeira natureza, foi uma ação direta de inconstitucionalidade “por omissão”, impetrada no Supremo Tribunal Federal (STF) pela Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj), a mesma que no começo do atual governo quis emplacar o policialesco Conselho Nacional de Jornalismo, e a Federação Interestadual dos Trabalhadores em Empresas de Radiodifusão e Televisão (Fitert). As entidades assinalam que a revogação da Lei de Imprensa pelo próprio STF deixou sem regulamentação o direito de resposta na mídia e pedem que o vazio seja preenchido. À primeira vista, pode parecer uma demanda de todo procedente. Mas não é, como se verá adiante.
Já o pretendido conselho cearense, que depende da sanção do governador Cid Gomes, do PSB, quer fiscalizar os meios de comunicação do Estado, criar condições para a “democratização” da informação e orientar a distribuição das verbas publicitárias estaduais considerando a “qualidade e pluralismo” da programação dos órgãos da mídia eletrônica. Os controladores, reguladores e, em última análise, vigias do sistema serão 25 conselheiros, dos quais 18 da sociedade civil, incluindo representantes dos meios de comunicação, sindicatos e consumidores. Eles julgarão o desempenho e a conduta ética da mídia local com base na Constituição, Declaração dos Direitos Humanos “e outros tratados internacionais”.
O presidente do Sindicato dos Jornalistas do Ceará (Sindjorce), Claylson Martins, nega que o órgão tenha pretensões censórias, já que as eventuais sanções a que estiverem expostas dependerão do Judiciário - como se pudesse ser de outra forma no Estado Democrático de Direito. Mas o palavreado apaziguador não engana. Para o diretor executivo da Associação Nacional de Jornais (ANJ), Ricardo Pedreira, a proposta é “obscurantista, autoritária e inconstitucional”. “Quem deve controlar os veículos de comunicação deve ser a sua audiência”, argumenta. “Não cabe a nenhum órgão do Estado exercer esse papel.”
Enquanto a intenção de assediar a imprensa é manifesta na iniciativa do PT do Ceará, os petistas da Fenaj escolheram um caminho mais sinuoso para o mesmo objetivo. Isso porque a ação por eles impetrada no Supremo Tribunal vai além da correção da lacuna legal sobre o direito de resposta, com o fim da Lei de Imprensa. Quando cobram a regulamentação da matéria, dão ao termo “direito de resposta” um sentido ameaçador, que extrapola o artigo 5.º da Constituição, que o consagrou. A ação cita dois outros artigos que tratam da mídia eletrônica e que não guardam relação com a faculdade de as pessoas publicarem na imprensa as suas versões dos fatos ou situações em conexão com os quais se viram citadas.
Um artigo é o 221, segundo o qual a programação das emissoras deve dar preferência a finalidades educativas, artísticas e informativas, respeitados os valores éticos e sociais da pessoa e da família. O outro artigo é o que o precede, que determina que lei federal deve garantir ao público a possibilidade de se defender de programações que contrariem o disposto no texto anterior. Assim, na interpretação da Fenaj, a lei deveria dar a cada espectador ou ouvinte o direito à divulgação de suas opiniões, nos próprios canais e estações, sobre os respectivos programas. Não é preciso nenhum voo de imaginação para imaginar a avalanche de pressões orquestradas contra a mídia eletrônica se o Congresso aprovar a legislação reivindicada - o que pedem que o STF induza, em regime de urgência.
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