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segunda-feira, 11 de outubro de 2010

DILMA - Gaspari precisa pôr o fígado de lado e se ater mais aos fatos


A 3 de outubro, dia da realização do primeiro turno, Elio Gaspari escreveu um notinha curta, a saber:

A FALTA DE RUTH
Se Ruth Cardoso estivesse viva, a charanga do tucanato não teria tomado o caminho da baixaria que atribuiu a Dilma Rousseff a defesa da legalização do aborto. Ela nunca se associou a esse tipo de tática eleitoral. Vale lembrar que seu marido também nunca jogou esse jogo.”

Eu o contestei no texto Elio Gaspari se candidata a censor da campanha eleitoral. E demonstrei que os tucanos não haviam “atribuído” coisa nenhuma a Dilma. Ela, de fato, defendera a legalização do aborto mais de uma vez. Pois bem: o companheiro não se deu por vencido e voltou hoje à carga. Está entre aqueles que decretaram, com certa precocidade, a derrota humilhante de Serra. Caso o tucano vença, é Gaspari quem perde — aliás, a fila é gigantesca! Perde o quê? A pose! A simples realização do segundo turno já desmoralizou muitas pitonisas… Hoje ele resolveu escrever um pouco mais. Então vai um vermelho-e-azul com ele. Começo pelo título.

O debate do aborto, Miriam Cordeiro 2.0
É mentira!


VINTE E UM ANOS depois da noite em que Mirian Cordeiro, a ex-namorada de Lula, surpreendeu o país acusando-o de ter sugerido que abortasse a criança que viria a ser sua filha Lurian, a palavra maldita voltou à agenda da sucessão presidencial. Em 1989 a questão do aborto foi fertilizada pelo comando da campanha de Fernando Collor. Desta vez, reapareceu com o mesmo formato oportunista, trazida pela infantaria do tucanato. 


Nos dois casos, ninguém mostrou-se interessado em discutir o assunto ao longo dos meses anteriores à eleição. O propósito, puramente eleitoral, sairá da agenda depois do dia 27. Até lá, terá emburrecido o debate, rebaixado a campanha e tisnado a biografia dos beneficiários da baixaria.
Vamos ver: quem achou Mirian Cordeiro foi o agora lulista Fernando Collor. Quem encontrou o tema do aborto e o transformou numa questão TAMBÉM ELEITORAL — como é em qualquer país do mundo — foi, literalmente, a sociedade. Não toda ela, que isso não existe, mas as várias confissões cristãs. Os tucanos não moveram a vontade dos católicos e evangélicos como Collor moveu a vontade de Mirian Cordeiro. Trata-se de uma mentira grotesca.

Também é mentira que o debate não estava dado: esquentou com o Programa Nacional-Socialista de Direitos Humanos, que trazia a legalização do aborto como um… direito humano. E, como confessa um representante de Dilma no post acima, ali estava o programa da própria Dilma, já que o texto fora elaborado na Casa Civil.
Gaspari tem de apurar melhor as informações. Tanto houve mobilização contra o PNDH3 que o governo se viu obrigado a recuar nessa e em outras questões, ainda que de modo um tanto malandro. Caso o colunista decida pôr o fígado de lado para se ater aos fatos, encontrará críticas severas do tucano José Serra ao plano — especialmente  à inclusão da legalização do aborto.

Então ficamos assim: a) é mentira que os tucanos tenham lançado a questão; b) é mentira que ninguém estivesse debatendo o assunto antes. Quanto ao emburrecimento do debate, vamos ver o que Gaspari acha inteligente.

Há 19 anos tramita na Câmara um projeto que dá à mulher o direito de interromper voluntariamente uma gravidez. Em 2008, por unanimidade, ele foi rejeitado na Comissão de Seguridade Social e Família. Pelo andar da carruagem, se não morrer antes, levará anos para chegar ao plenário. Se e quando isso acontecer, caberá ao Congresso decidir.
Faltam algumas coisinhas aí: foi derrotado, sim, apesar da mobilização dos petistas, em particular de José Eduardo Cardozo, coordenador da campanha de Dilma Rousseff. A decisão cabe ao Congresso, mas a influência do chefe do Executivo em qualquer matéria votada no Parlamento é grande. Isso é o de menos: o importante é que os eleitores têm o direito de saber o que pensam aqueles que se candidatam a governá-los.

Flertando com a transformação do aborto numa “bala de prata” eleitoral, o tucano José Serra expôs sua posição: “Nunca disse que sou contra o aborto porque eu sou a favor, ou melhor, nunca disse que sou a favor, porque sou contra”. Em seguida, expôs a ferida petista: “O que está em questão nessa campanha não é ser contra ou a favor. É a mentira”. O comissariado petista e Dilma Rousseff defenderam programática e pessoalmente a descriminalização do aborto.
“Bala de prata” é uma expressão empregada por Dilma Rousseff, depois de ter sido lançada como uma espécie de palavra de ordem por Giberto Carvalho. Ele dizia que a o “caso da Receita” era a bala de prata. Gaspari tenta transformar uma confusão normal da fala num ato falho. Não cola! A questão — e Serra, como até Gaspari nota, foi ao ponto — é outra: se Dilma era favorável à descriminação até abril do ano passado, por que diz ter mudado de idéia? A resposta é óbvia, não? Percebeu que o eleitorado pensa outra coisa.

Chegou-se a um conflito de oportunismos. O dos tucanos, que só lembraram do assunto na reta final da campanha, e o dos petistas que, na mesma reta, mudam de opinião.
O colunista, embora anti-Serra, esforça-se para parecer isento, acusando o oportunismo de ambos os lados. Como não conseguiria dizer onde está o oportunismo do tucano, acaba, na prática, privilegiando Dilma. O candidato do PSDB, reitero, já havia criticado duramente a inclusão da legalização do aborto no PNDH3. Já havia se declarado, também, contrário à legalização. De fato, confissões cristãs se mobilizaram — PROVOCADAS, ORIGINALMENTE, PELO PNDH3, REITERO. E se cobrou do candidato uma posição. O que Gaspari esperava que ele fizesse? Que não dissesse o que pensa para não deixar Dilma chateada? O oportunismo, no caso, é de um lado só.

Afora o oportunismo, o nível da discussão abortou a inteligência. Dilma Rousseff disse que “as mulheres ricas têm acesso a clínicas, mulheres pobres usam agulha de tricô”. Propagou a lenda produzida pelo filme “Pixote”, de 1981. Mesmo há 30 anos essa prática era desprezível. Hoje, nem pensar. A forma mais comum de aborto se dá com o uso da droga Cytotec. Em tese, sua comercialização é proibida. Na prática, custa em torno de R$ 400 e pode ser comprada pela internet. Estima-se que, de cada dez abortos, sete sejam feitos com Cytotec.
Como se nota, nesse caso, Gaspari não conseguiu encontrar o “aborto da inteligência” do tucano. Quem resolveu dramatizar foi a petista. Mesmo num trecho tão crítico, o colunista ainda atua como o Grilo Falante de Dilma — depois de ter sido a Fada Sininho de Lula por oito anos. A candidata recorre a essa retórica terrorista, sanguinolenta, como ARGUMENTO, SENHOR GASPARI, para defender a legalização do aborto de modo oblíquo. Tal horror a justificaria. A imagem da agulha, diga-se, é a preferida dos grupos pró-aborto.

Em 1990, o professor Laurence Tribe, de Harvard, publicou um livro intitulado “Aborto - O Choque de Absolutos”. (Entre os seus pesquisadores estava um estudante de direito chamado Barack Obama.) Tribe mostra que o aborto divide as sociedades e, sem uma certeza religiosa, não há como sair do debate seguro de que um lado está certo e o outro, errado. O aborto não é apenas uma questão de saúde pública, como a dengue. Trata-se de um conflito entre o direito do feto à vida e o direito da mulher à liberdade de interromper sua gravidez. (Sempre até o terceiro mês da gestação.)
Huuummm… Bem, então é um debate pertinente, certo? Há os que, como Dilma, se alinham com o “o direito da mulher à liberdade de interromper sua gravidez”, e há aqueles — como Serra, este escriba e, estou certo, a esmagadora maioria dos brasileiros — que se alinham com o “direito do feto à vida”. Trata-se de uma escolha moral. Eleição é um bom momento para fazer esse debate. A militância do PT em favor do aborto é histórica. Que vá para o confronto de idéias, ora essa!

Em 1973, a Corte Suprema dos Estados Unidos decidiu, por sete a dois, que as mulheres têm esse direito. No mesmo dia, julgaram dois casos. Uma das mulheres abortou. A outra perdeu o prazo e concebeu uma menina. Passaram-se 37 anos, a mãe mudou de idéia e tornou-se uma militante contra o aborto. A filha defende a decisão da Corte, que teria evitado seu nascimento.
Huuummm… E daí?

No Brasil de hoje é improvável que o Supremo Tribunal Federal reconheça o direito das mulheres de interromper a gravidez. Também é improvável que o Congresso vote uma lei nesse sentido. A candidata Marina Silva, a única a expor uma posição que faz sentido, é contra o aborto, mas remeteria a questão a um plebiscito, no qual a proposta dificilmente seria aprovada.
Comecemos pelo fim: se, dificilmente, seria aprovada, então a maioria dos brasileiros deve ser contra — maioria que tem o direito de saber qual é a opinião daqueles que pretendem governá-la. Quanto a Congresso e Supremo, Gaspari está apenas chutando. No que respeita a Marina, longe de fazer sentido, sua posição é a do descompromisso.

Sobrou o lixo: a instrumentalização do tema para satanizar adversários políticos. Collor fez isso com rara maestria.
Atribuir a Dilma o que ela realmente pensa é satanização? Por quê? Lixo é afirmar, por exemplo, que o adversário político vai privatizar estatais quando se sabe que isso é mentira. Satanização é acusar um governo de fazer “privataria” quando não se tem em mãos uma miserável prova de irregularidade. Ao contrário: tem-se a evidência da lisura do procedimento.

A baixaria circula na campanha presidencial de um país onde a rede pública de saúde do estado de São Paulo mantém, desde 1986, o Programa de Atenção Integral à Adolescente. Para júbilo internacional, entre 1998 e 2008 a internação de adolescentes por conta de abortos caiu de 10 mil por ano para 8.700. Mais: a gravidez de jovens de 10 a 20 anos caiu 38%, para 94 mil. Reduziu-se à metade os casos de segunda gravidez nessa faixa de idade.
E, não obstante, a saúde em São Paulo é satanizada pelo PT sob o silencio cúmplice de certo colunismo, não é mesmo?

Gaspari está bravo porque o aborto virou tema, como ele gosta de dizer, do “andar de baixo”. Enquanto dizia respeito a gabinetes ministeriais, militância feminista — a Secretaria das Mulheres e o Ministério da Saúde se tornaram centros de proselitismo em defesa da prática — e descolados em geral, tudo bem! Mas esse é um daqueles temas que teriam de ser mantidos longe do “povão”. “Povão” é para receber cartão do Bolsa Família, encher a pança na birosca da esquina, votar no PT e ficar de bico calado, certo?

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